quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

O rapto de Perséfone – Um conto de Deméter - Parte I


O outono é a época das colheitas, a época em que os agricultores alegram-se e comemoram a fartura e a abundancia da vida, o momento de reunir os familiares e amigos em grandes banquetes pelas cabanas mais modestas, mas instantaneamente mais fartas da região campestre.

O outono é assim para quem vive do campo, mas houve um período de escassez, em que as flores vieram, entretanto se foram sem deixar o fruto de sua beleza, e o motivo poucos sabiam, poucos puderam presenciar o sofrimento contido na alma da terra, na mãe dos campos e dos trigos, na matrona Deméter.

Deméter, como é sabido, possuía uma belíssima filha, a única qual amava verdadeiramente, fruto da alegria, mais doce que a ameixa arroxeada e mais belas que os campos de trigo, Persófone era seu nome e vivia vagando pelos campos. E, justamente nesses passeios foi que Hades, o rei dos mortos, enamorou-se perdidamente dela, e em um curto espaço de tempo raptou-a como faz a abelha do néctar das flores.

Ao perceber tamanha desgraça que fora ter perdido sua filha, Deméter saiu em busca sem destino, sem rumo, pelo mundo afora. Deixou o Olimpo sem comunicar a nenhum habitante dele, e pior, deixou os humanos sem as bênçãos da fertilidade.

As orações dedicadas a ela pelos clementes artesãos de nada serviam, eram vazias como a madeira consumida pelos cupins que por fora ainda consistia a beleza, mas por dentro a podridão espera pelo mais simples toque para desabar. A fome com sua mão negra passou pela terra, ceifando as sementes, roubando das flores a aura da vida, a juventude e seu perfume, e dos homens roubava os mais fracos e debilitados esperando lentamente perecer os mais fortes como o carrapato espera pacientemente o momento de deixar a árvore e se jogar para a terra em busca de sangue.

Deméter, para não ser reconhecida transfigurara sua imagem em uma de simples camponesa, tornando seus brilhantes cabelos castanhos perderem o brilho e a forma, caindo-lhe mediocremente pelo talhe, suas vestes divinas, viraram simples panos comuns aos camponeses, e sua tez suave permitiu a natureza gravar suas marcas, assim estava, muito pior por dentro que por fora, não havia motivo para buscar sua filha resplandecendo algo que não conseguia ser, já não possuía o vigor de um broto que rompe a terra em direção ao céu, estava como um broto que rompe a terra e se depara com a escuridão, e estiola em meio a confusão, sem rumo.

Por longos dias andou a finco, passando por bosques e estepes, por rios e cachoeiras, até que depois de muito andar num dia, parou para descansar debaixo de uma árvore. Nesse momento um camponês com sua filha passavam pelo lugar, um homem simples com um chapéu característico e com uma cesta praticamente fazia se fosse pelos poucos figos que ainda resistiam a falta de vigor da terra, e parecia que a falta de vigor também assolava o pobre homem, que já encurvado mostrava sinais de fraqueza, talvez o fruto de abrir mão de seus poucos alimentos para dá-los aos seus filhos. O mesmo já não ocorria com a menina que correndo na frente de seu pai, pulava e cantava ainda feliz, apesar da escassez, com a natureza ao seu redor.

Eis que correndo na frente ela se depara com Deméter, e confundindo-a com sua mãe chama-a carinhosamente de mamãe e sai em direção para abraçá-la, esse foi o estopim para que as lágrimas viessem no rosto de Deméter que se volta para o lado da menina, para a surpresa desta, e abre os braços carinhosamente dizendo que não é sua mãe, a menina mesmo sem entender o que de fato ocorria abraça aquela jovem mulher e espera até o seu pai chegar.

Continua no próximo post...

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